EXEMPLO ILUSTRATIVO DE DIFICULDADE DE DEFINIR ATIVIDADE TERCEIRIZADA
A Terceirização é uma daquelas matérias ainda não regulamentadas legalmente em nosso ordenamento jurídico. Modalidade de relação de trabalho importada de outros países, se difundiu no nosso, nos anos 90, em escala tal a ponto de o TST, na falta de orientação legal a respeito, ter de traçar orientações, por meio da SÚMULA 331, a qual, hoje, regulamentando o assunto, é a única fonte de referência normativa.
Por força desse enunciado, atualmente é pacífico o rol de algumas atividades terceirizáveis: os serviços de vigilância, conservação e limpeza, transporte, cozinha, bem como “os serviços especializados ligados a atividade-meio do tomador”. A expressão “serviços especializados ligados a atividade-meio do tomador” deixa um campo aberto ao surgimento das mais diversas interpretações extensivas, cuja solução, muitas vezes, requer apreciação judicial. Os defensores da terceirização se valem do art. 170 e do art. 1º., inciso IV, da Constituição Federal, para justificar não haver impedimento legal de terceirização nas atividades fins da empresa, pois o instituto proibitivo é um anunciado, sem eficácia de lei. Os contrários a ela utilizam o argumento de precarização das relações de trabalho. É oportuno observar o seguinte: mesmo não tendo o enunciado status de lei, não deixa de ser um instrumento eficaz, traduzindo o entendimento de um tribunal superior, dotado de poder legal de emitir orientações jurisprudenciais.
Como as orientações dos tribunais - súmulas, OJs - expressam resenhas de conceitos, a aplicação, na prática, sofre distorções. Narraremos, abaixo, um caso específico, ilustrativo, para mostrar como foi discutido e qual entendimento teve o Mediador, na Superintendência Regional do Trabalho.
O sindicato dos Metalúrgicos levantou o questionamento: a SAMSUNG mantinha empregados terceirizados desempenhando a função de acoplar um anel de borracha, num Cinescópio de TV, antes de entrar na linha de produção, para receber os demais componentes e se transformar em produto acabado. A empresa defendia a natureza de atividade terceirizável; a justificativa: o acoplamento da bobina se dava antes da entrada do produto na linha de produção.
O sindicato considerava a inserção da bobina já uma atividade de linha de produção, pois havia a intervenção direta no produto, imprescindível ao seu funcionamento e ao recebimentos de outros componentes. Em mesa redonda, as partes queriam a posição do mediador. Ele não podia ter outro entendimento senão o já definido no comando da SÚMULA 331 do TST, passível, em todo caso, de apreciação judicial.
Daí todo o cuidado de emitir um posicionamento eivado de segurança jurídica, porque fugia à sua competência declarar, de forma definitiva, como terceirizável, essa ou aquela atividade.
Dessa forma, o mediador, ciente do limite de sua competência administrativa, emitiu seu entendimento, sem valor imperativo, mas apenas a título de subsidio técnico à discussão, sopesando os prós e os contras, a fim de as partes decidirem por si mesmas.
Conforme o enunciado 331 , do TST, terceirizam-se serviços. Na terceirização, os empregados da terceirizada não podem estar subordinados aos dirigentes da tomadora, nem deve haver a pessoalidade, ou seja, a terceirizada deve executar o serviço contratado, com tais ou quais empregados, sem interferência da tomadora sobre eles, embora, na prática, não aconteça assim.
No caso em analise, o acoplamento da bobina não parece ser um serviço, mas um passo de um conjunto de tarefas da linha de montagem. Os empregados da terceirizada, de alguma forma, eram subordinados da tomadora. Do contrário, não haveria como garantir o controle de qualidade. O acoplamento da bobina, no início da linha de produção, tem mais natureza de atividade-fim, pois a atividade meio, se paralisada, não deve prejudicar a atividade principal da empresa. Exemplo: ficando a empresa, por uma semana ou mais, sem serviço de conservação e limpeza, segurança continuaria fabricando seu produto. Cessando as atividades de acoplar a bobina, o produto não se completaria e pararia a linha de produção.
Portanto, na direção da jurisprudência atual, o mediador não poderia adotar outro entendimento senão esse: a situação tem mais cores de atividade-fim. Por outro lado, sugerindo uma possibilidade de solução a favor da empresa, fez a seguinte ponderação: se tal atividade fosse realizada pela terceirizada em local próprio e num momento de não simultaneidade com a colocação do produto na linha de montagem, teríamos uma outra situação. A empresa já sabia disso; mas para ela ficava inconveniente o transporte de materiais para a terceirizada e, depois, para a sua linha de produção; no afã empresarial de facilitar as coisas e reduzir custos, tinha encontrado apenas aquela alternativa, como a mais viável. Submetida, porém, à apreciação dos operadores do direito, mostrava-se imantada de insegurança jurídica.
Com o presente texto, pretendemos apenas mostrar a dificuldade de tratar a matéria terceirização, num complexo infinito de diversidade de atividades empresariais de todo gênero; a terceirização fica numa zona cinzenta de difícil visualização; precisa, em casos duvidosos, passar pelo crivo judicial.
Francisco das Chagas Rodrigues
Advogado.
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