INTEGRAÇÃO DE ADICIONAIS SOBRE ADICIONAIS - Uma visão crítica
Até o momento de abrir o volume do processo, para ver a Pauta da reunião, constante de ofício, pelo qual o sindicato solicitou mesa redonda com quatro empresas, o mediador desconhecia o assunto a ser tratado. Uma falha. Nunca se deve iniciar uma mediação sem antes estudar os pontos de Pauta. Ainda mais se de natureza trabalhista. O direito do trabalho é cheio de nuances movediças. Os tribunais são pródigos em interpretações extensivas da lei, criando um verdadeiro cipoal de jurisprudência por vezes confusa. A redação das súmulas e das orientações jurisprudenciais guarda, em sua síntese, um alto teor generalista e conceitual, a ponto de juizes e doutrinadores se verem, vez e outra, confrontados com a necessidade de reinterpretá-los, contrariando a finalidade precípua: um entendimento resumido e inteligível a várias decisões contraditórias. Tais entendimentos chegam envoltos numa nuvem de dúvidas à planície, onde operam os contadores, os gerentes de pessoais, os leigos no assunto. Veremos, abaixo, um exemplo de construção jurisprudencial complexa.
As partes já estavam à mesa de reunião, mas quando o mediador leu os pontos de pauta, concluiu não serem objetos de mediação. Não podia emitir entendimento definitivo sobre adicionais de insalubridade, periculosidade e noturno, diferente do prevista na CLT. Se quisessem discutir informalmente o assunto, até aceitaria. Lidava com eles diariamente e estava apto a manuseá-los. Mas apenas a título de curiosidade intelectual. Essa questão de hierarquia de competências entre órgãos administrativos e judiciais deixa o servidor público patinando numa zona de insegurança entre a eficácia do comando legal e a das decisões jurisprudenciais, estas a princípio sem a força de vincular os atos administrativos. O serviço de fiscalização do Ministério é vinculado à lei; então, como deve agir o fiscal do trabalho, por exemplo, diante do surgimento de uma nova jurisprudência? Por necessidade de dar encaminhamento objetivo a assuntos dessa natureza, tem de encontrar um meio de conciliar sua ação vinculada à lei com seu posicionamento diante de orientações jurisprudenciais. E aguardar instruções normativas da instituição para a qual trabalha, para agir com segurança nessa zona cinzenta. Embora não possa exigir o cumprimento das orientações dos tribunais, deve respeitá-las e jamais penalizar a empresa por cumpri-las. Dever continuar exigindo o cumprimento legal e, ao mesmo tempo, respeitando as determinações dos tribunais, mormente as já sumuladas. Deve ter a humildade de aguardar a posição do seu órgão, por meio de alguma instrução normativa ou outro meio de regulamentar as rotinas de trabalho.
Nessa linha de dar uma resposta, como Auditor fiscal do Trabalho, fizemos, então, o resumo abaixo, começando por relacionar as súmulas e orientações jurisprudenciais e, depois, confrontá-las entre si, para, afinal, digerirmos a salada tão rica em sabor de dúvidas e imprecisões.
Súmulas e orientações jurisprudenciais a respeito de insalubridade, periculosidade, adicional noturno e horas extras.
Súmula 60 - I - O adicional noturno, pago com habitualidade, integra o salário do empregado para todos os efeitos.
Súmula 264 - A remuneração do Serviço Suplementar é composta do valor da hora normal, integrado por parcelas de natureza salarial e acrescido do adicional previsto em lei, contrato, acordo, convenção coletiva ou sentença normativa.
OJ-SDI1-47 - HORA EXTRA. ADICIONAL DE INSALUBRIDADE. BASE DE CÁLCULO (alterada) – Res. 148/2008, DJ 04 e 07.07.2008 - Republicada DJ 08, 09 e 10.07.2008
A base de cálculo da hora extra é o resultado da soma do salário contratual mais o adicional de insalubridade.
OJ 97 da SDI-I - Horas Extras. Adicional noturno. Base de cálculo. O adicional noturno integra a base de cálculo das horas extras prestadas no período noturno.
Súmula 132 - I - O adicional de periculosidade, pago em caráter permanente, integra o cálculo da indenização e de horas extras.
OJ 259 do Pleno do TST: Adicional noturno. Base de cálculo. Adicional de periculosidade. Integração. O adicional de periculosidade deve compor a base de cálculo do adicional noturno, já que também neste horário o trabalhador permanece sob as condições de risco (ins. Em 27.9.02).
SÚMULA 228 DO TST - ADICIONAL DE INSALUBRIDADE. BASE DE CÁLCULO (redação alterada na sessão do Tribunal Pleno em 26.06.2008) - Res. 148/2008, DJ 04 e 07.07.2008 - Republicada DJ 08, 09 e 10.07.2008. SÚMULA CUJA EFICÁCIA ESTÁ SUSPENSA POR DECISÃO LIMINAR DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL - Res. 185/2012, DEJT divulgado em 25, 26 e 27.09.2012
A partir de 9 de maio de 2008, data da publicação da Súmula Vinculante nº 4 do Supremo Tribunal Federal, o adicional de insalubridade será calculado sobre o salário básico, salvo critério mais vantajoso fixado em instrumento coletivo.
Obs. A eficácia dessa súmula está suspensa justamente quanto à indicação do SALÁRIO BÁSICO como base de cálculo da insalubridade. Como a base de cálculo da insalubridade está indefinida, em razão da súmula 04, do STF, fica valendo, até definição, o PISO SALARIAL, o SALÁRIO PROFISSIONAL ou o próprio SALÁRIO MÍNIMO, se o empregado ganha realmente esse valor. Os interessados devem regulamentar essa situação por meio de cláusula em Instrumentos Coletivos de Trabalho.
- Analisando o cipoal de jurisprudência acima exposto, podemos inferir o seguinte:
1.1- Os três adicionais - segundo a jurisprudência, fique bem claro - INSALUBRIDADE, PERICULOSIDADE e NOTURNO - integram o salário para cálculo de HORAS EXTRAS, conforme OJ 47, Súmula 132-I e OJ 97 respectivamente.
Na prática seria o seguinte:
Se houver trabalho em HORA EXTRA no período noturno, em ambiente com PERICULOSIDADE ou INSALUBRIDADE, as equações para o cálculo do valor do ADICIONAL NOTURNO e do valor das HORAS EXTRAS seriam conforme abaixo:
- BASE DE CÁLCULO DO ADICIONAL NOTURNO: Soma-se a Periculosidade (ou Insalubridade) ao Salário, para achar o valor da base de cálculo da Hora do Adicional Noturno.
- BASE DE CÁLCULO DA HORA EXTRA: Somam-se novamente a Periculosidade (ou insalubridade) ao Salário mais o valor do Adicional Noturno achado no item anterior, para encontrar a Base de cálculo da Hora Extra.
- Análise de cada Instituto:
2.1 - Insalubridade
Conforme explicado no item anterior, a BASE para cálculo do valor da INSALUBRIDADE está sem previsão legal, no momento. Enquanto durar essa situação, deve ser determinada pelos Instrumentos Coletivos de Trabalho.
2.1.1 – O ADICIONAL DE INSALUBRIDADE INTEGRA O SALÁRIO PARA CÁLCULO DE ADICIONAL NOTURNO?
Segundo a Orientação Jurisprudencial 259, acima citada, o adicional de periculosidade compõe a base de cálculo do Adicional noturno.
OJ 259 do Pleno do TST: Adicional noturno. Base de cálculo. Adicional de periculosidade. Integração. O adicional de periculosidade deve compor a base de cálculo do adicional noturno, já que também neste horário o trabalhador permanece sob as condições de risco (ins. Em 27.9.02).
Observação: por analogia, o adicional de insalubridade também deve compor a base de cálculo do adicional noturno, tal qual o adicional de periculosidade. No horário noturno o empregado permanece, também, sob condições insalubres.
E a Súmula 139, do TST, parece determinar isso: “Enquanto percebido, o adicional de insalubridade integra a remuneração para TODOS OS EFEITOS LEGAIS.
Se é para todos os efeitos legais, então, a INSALUBRIDADE, como a periculosidade, também integra a Base de Cálculo do Adicional Noturno.
Na prática, se quer dizer o seguinte: para se achar a base de cálculo do ADICIONAL NOTURNO, soma-se ao Salário normal o valor da Insalubridade.
2.1.2 - INTEGRAÇÃO DO ADICIONAL DE INSALUBRIDADE NO CÁLCULO DE HORAS EXTRAS-
Segundo orientação jurisprudencial:
Súmula 139 do TST: Enquanto percebido, o adicional de insalubridade integra a remuneração para todos os efeitos legais.
Portanto, segundo a jurisprudência, o adicional de insalubridade integra o Aviso Prévio, 13º, férias, HORAS EXTRAS, exceto o DSR (pois o pagamento é mensal, já com o DSR embutido).
Inclusive o Ministério do Trabalho se pronunciou administrativamente a respeito, por meio do Precedente Normativo 76:
PRECEDENTE ADMINISTRATIVO Nº 76
ADICIONAL DE INSALUBRIDADE. REFLEXO SOBRE HORAS EXTRAS. REVISÃO DO PRECEDENTE ADMINISTRATIVO Nº 67.
A remuneração do trabalho extraordinário realizado em condições insalubres deve ter como base de cálculo o salário normal acrescido do adicional de insalubridade.
Referência Normativa: art. 59, §1º e art. 192 da CLT.
Na prática: para se achar o valor da Hora Extra, soma-se ao Salário o Adicional de Insalubridade. Se a hora Extra é prestada no Período Noturno, acrescenta-se, também, o valor do Adicional Noturno.
2.2 - ADICIONAL DE PERICULOSIDADE
É um instituo melhor regulamentado pela jurisprudência: o art. 193, § 1º, da CLT, define o salário como sua base de cálculo, sem os acréscimos resultantes de gratificações, prêmios ou participações nos lucros. A Sumula 191, do TST, restringe mais ainda as incidências, ao excluir “outros adicionais”
2.2.1 – INTEGRAÇÃO DO ADICIONAL DE PERICULOSIDADE NO ADICIONAL NOTURNO
Segundo a jurisprudência:
OJ 259 do Pleno do TST: Adicional noturno. Base de cálculo. ADICIONAL DE PERICULOSIDADE. Integração. O adicional de periculosidade deve compor a base de cálculo do adicional noturno, já que também neste horário o trabalhador permanece sob as condições de risco (ins. Em 27.9.02).
2.2.2 – INTEGRAÇÃO DO ADICIONAL DE PERICULOSIDADE em Horas Extras
Súmula 132 - I - O adicional de periculosidade, pago em caráter permanente, integra o cálculo da indenização e de horas extras.
Ou seja, segundo a jurisprudência e doutrina, o adicional de periculosidade integra o Aviso Prévio, Horas Extras, 13º, férias, exceto o DSR (pois o pagamento é mensal).
2.3 - ADICIONAL NOTURNO
Segundo o art. 73, caput, da CLT, “o trabalho noturno terá remuneração superior à do diurno...”. O termo remuneração sugere uma base de cálculo, para o adicional noturno, constituído de salário e outros adicionais.
OJ 97 da SDI-I - Horas Extras. Adicional noturno. Base de cálculo. O adicional noturno integra a base de cálculo das horas extras prestadas no período noturno.
OJ 259 do Pleno do TST: Adicional noturno. Base de cálculo. Adicional de periculosidade. Integração. O adicional de periculosidade deve compor a base de cálculo do adicional noturno, já que também neste horário o trabalhador permanece sob as condições de risco (ins. Em 27.9.02).
Dessa forma, há uma questão de sequência preferencial de integração de adicionais: vejamos um exemplo prático. Salário RS 900,00;
-Base de Cálculo do Adicional Noturno - o valor da hora diurna
-Base de Cálculo do Adicional Noturno quando há Periculosidade – o valor da hora diurna somada com a periculosidade
Base de Cálculo do Adicional Noturno quando há Insalubridade – o valor da hora diurna somada com a Insalubridade.
Base de Cálculo da Hora Extra – Valor da Hora Diurna mais a Periculosidade (ou insalubridade) mais o Adicional Noturno.
Se há periculosidade (ou insalubridade), as Horas Extras realizadas no período noturno devem ser calculadas sobra a base seguinte: Piso + Periculosidade (ou insalubridade) + Adicional Noturno.
Conclusão:
A jurisprudência, ao embalo da doutrina, produziu um mecanismo de incidência de Adicionais em cascata. A nosso ver, essas integrações em cascata de índices sobre índices, na remuneração, emperram a administração de pessoal das empresas e sobrecarregam o custo Brasil. Veja-se: as horas extras integram o DSR, as férias, o décimo terceiro, a Aviso Prévio. Já para se calcular o valor da Hora Extra é preciso integrar ao Salário o Adicional de Insalubridade ou de Periculosidade, Adicional Noturno, Gratificações, etc. Não seria melhor aumentar o percentual de Horas Extras (50%), de forma a remunerar todas essas incidências? Os defensores dessa tendência jurisprudencial de criar incidências intermináveis usam o argumento da necessidade de encarecimento das Horas Extraordinárias para dificultar sua prática pelas empresas ou de criação de artifício jurídico para elevar indiretamente os salários. Termina tendo efeito contrário, motivando o empregado a praticá-las mais e mais, para complementar seu salário. Pensamos de modo contrário. Estamos precisando mesmo é de uma desburocratização geral, em todas as instâncias administrativas, e não apenas nos procedimentos e práticas de folhas de pagamento, para eliminar todos esses penduricalhos gerados pela nossa cultura jurídico-administrativa de excesso de zelo em criar artifícios complicadores da vida do cidadão. Precisamos combater a complexidade, para simplificação dos programas de folha de pagamento; a racionalização de rotinas dos encarregados do serviço de cálculo trabalhista, nas instâncias judiciárias e nas empresas; segurança jurídica e destravamento das amarras do atraso do país. Tal gargalo jurídico gera os mesmos problemas causados pela precariedade das estradas do país, o engarrafamento do tráfego nas cidades e a lentidão da internet. Sem esses recheios técnicos, seria bem mais fácil determinar o valor de uma causa judicial, escolhendo como Base de cálculo apenas o Salário Normal, para, a partir dele, determinar os quantitativos de atributos (horas extras, adicionais de insalubridade ou periculosidade, horas noturnas); depois só aplicar-se-iam a Correção Monetária e os Juros. Tal critério lubrificaria, com o bom azeite de oliva da eficiência, o princípio da celeridade. Por tais artifícios jurisprudenciais, as empresas precisam de um exército de técnicos, advogados, para interpretar as leis. Já dizia o poeta Khalil Gibran: “a simplicidade é o último degrau da sabedoria”. Precisamos descomplicar os procedimentos. Torná-los simples. Criarmos leis mais palatáveis e práticas burocráticas de fácil execução. O ônus do cidadão, com excesso de impostos, já é muito alto. Não merece o sacrifício de, além de pagar, enfrentar a dificuldade de pagar. Um país só pode achar o caminho da modernização pelas sendas da simplicidade: menos cálculos a efetuar, menos teclas a bater, menos papel a circular, menos gente a controlá-los, menos complexidade nos programas de computadores.
O auditor fiscal do trabalho, em inspeção à empresa, não pode exigir o cumprimento de súmulas e orientações jurisprudenciais.
Por tais motivos, não foi aceita a mediação, pois, conforme a CF “ninguém é obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”. O mediador, portanto, embora não vinculado à observância de entendimentos jurisprudenciais, não poderia deixar de recomendar-lhes o cumprimento; afinal de conta, as reclamações judiciais vão desaguar, em última instância, nos tribunais onde nasceram as súmulas e as orientações.
Francisco das Chagas Oliveira Rodrigues
Advogado e Auditor Fiscal do Trabalho.
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